AÇÃO DE DESPEJO E O COVID-19

11/07/2020

DESPEJO NAS LOCAÇÕES E O COVID-19

RESUMO

O presente artigo tem como objetivo elucidar alguns pontos referentes à ação de despejo e a pandemia vivenciada hodiernamente, mais precisamente no que diz respeito às principais dúvidas que norteiam a mitigação de direitos, tais como: despejo, liminares e demais alterações.

Palavras-chave: Ações de Despejo - Contratos Imobiliários - Pandemia - COVID-19

1. INTRODUÇÃO

No caso da necessidade de retomada do imóvel objeto de relação locatícia, o ajuizamento da presente ação de despejo, seja qual motivo elencada na Lei de Locações é a principal forma de atribuição do exercício deste direito, qualquer que seja o fundamento do término da locação, não cabendo cogitar ações possessórias tais como, reintegração de posse ou de qualquer outra ação cível, pois esta é a regra, como mesmo preceitua o art. 5°, caput da citada Lei de Locações Lei n°. 8.245/91, revela a importância de tal medida, se não vejamos:

Art. 5º Seja qual for o fundamento do término da locação, a ação do locador para reaver o imóvel é a de despejo.[1]

Em verdade, não havendo acordo entre locador e locatário e fazendo-se, portanto, necessária a judicialização da questão, a ação de despejo perfaz o meio adequado para o locador reaver o bem locado.

No tocante a natureza jurídica, no dizer de Luiz Fux, a ação de despejo é:

"preponderantemente, uma ação pessoal, porque calcada em vínculo contratual e não em direito real".[2]

E não poderia ser diferente, dado que a posse (inclusive a posse cedida mediante celebração de contrato de locação) não consta do rol de direitos reais inseridos no art. 1.225 do Código Civil.[3]

2. DESENVOLVIMENTO

Não obstante, convém ponderar, acerca do tema do presente artigo, que atualmente vivenciamos um momento delicado nas relações contratuais, tão verdade, que direitos são mitigados face a estrutura atual e excepcional momentânea.

A doença que aflora a atualidade em questão COVID-19 é de facílima contaminação e tem alto potencial mortífero, especialmente em relação a idosos, asmáticos, pessoas com doenças do coração, fumantes e diabéticos. No Brasil, já são mais de 66.093 mortes e cerca de 1.643.539 contaminados, dados atualizados até às 13h de 07 de julho de 2020 em cerca de seis meses da eclosão do evento na China.[4]

Como é fato notório, a principal medida indicada, pelos especialistas, para o combate a essa doença é o distanciamento social. Nesse aspecto, o Poder Público, em âmbito Federal, Estatual e Municipal, vem adotando medidas cada vez mais severas, para efetivar esse remédio contra a propagação do vírus - o que vem acarretando-a, embora necessária, gravosa e repentina paralisação de toda atividade comercial.

O Ministro de Estado da Saúde, por meio da Portaria MS nº 188, de 3.2.2020, declarou Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN) em decorrência da infecção humana pelo Coronavírus.

Tamanho o impacto da pandemia, o Poder Público já tem editado uma série de medidas de cunho econômico, a fim de minimizar os impactos da crise gerada, desse modo, locatários estão tentando buscar a renegociação dos contratos de locação diretamente com os detentores de direitos sobre os imóveis.

O caráter de exceção da pandemia já vem justificando a atuação urgente do Judiciário para suspender temporariamente a exigibilidade do cumprimento de obrigações que tiveram sua fonte de receita afetada. Nesse sentido, observe-se a notável decisão de lavra do MM. Juízo da 25ª Vara Cível de Brasília, em 24.3.2020, que suspendeu disposições de contrato de locação comercial.

"Os fatos são claros, pois nenhuma pessoa em sã consciência e em perfeito juízo valorativo dúvida que há motivo imprevisível, vale dizer as consequências da metodologia de mitigação e supressão para conter a pandemia na vida cotidiana das pessoas, instituições e empresas em caráter mundial. A norma legal aparentemente aplicável também está razoavelmente delineada no art. 317 do Código Civil, pois é evidente que há, desde as medidas de mitigação e supressão do COVID19, manifesta desproporção entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução. (...)

Se todos as pessoas e empresas agirem como quer a empresa autora, será a vitória do egoísmo e do salve-se quem puder. Não há como simplesmente parar de adimplir as obrigações. O próprio contrato tem cláusula que nos ajuda a decidir neste ambiente de incerteza. O aluguel vinculado ao faturamento. Tal dispositivo contratual tem boa eficiência econômica, pois contém a regra de que se você ganha eu ganho. Se você perde eu perco. Necessária a cooperação para todos ganharem ou perderem juntos, a essência do Direito que atravessa os séculos: 'viver honestamente, não lesar a outrem, dar a cada um o que é seu'. (...)

De outro vértice, há iminente risco de ruína econômica e contágio a terceiros (trabalhadores especialmente) em face do dano ao provável direito invocado, não se podendo aguardar a demora normal do desenvolvimento da marcha processual, pois o empresário tem a dificílima decisão de escolher que obrigações adimplir nos próximos meses. (...)

Diante de tais fundamentos, DEFIRO em parte o pedido de antecipação dos efeitos da tutela para suspender parte do contrato de locação entre as partes (cláusula do aluguel mínimo e do fundo de promoção e propaganda), mantendo-se em pleno vigor as demais disposições contratuais".[5]

Note-se que não se está reconhecendo o direito se furtar ao pagamento das obrigações tributárias. O que se está reconhecendo é a possibilidade (precária e temporária) dela priorizar o uso da sua (atualmente) reduzida capacidade financeira (decorrente de ato da própria Administração - FATO DO PRÍNCIPE) na manutenção dos postos de trabalho de seus colaboradores (pagamento de salários etc.) e do custeio mínimo da sua atividade existencial em detrimento do imediato recolhimento das exações tributárias, sem que isso lhe acarrete as punições reservadas aos contribuintes que, em situação de normalidade, deixam de cumprir a legislação de regência".[6]

2.1 DO CASO FORTUITO - OCORRÊNCIA DE PANDEMIA - TEORIA DA IMPREVISÃO

Não obstante, o Código Civil Brasileiro, em seu artigo 393, nos esclarece que o devedor não responderá pelos prejuízos decorrente de caso fortuito ou força maior, vejamos:

Art. 393 . O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.

Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.

Neste sentido, a jurisprudência nos esclarece que estamos diante de caso fortuito, ou seja, colidimos com a teoria da imprevisão, na qual, o contrato não atingirá sua finalidade exclusivamente por culpa de terceiros, vejamos:

APELAÇÃO CÍVEL - CONTRATO DE LOCAÇÃO CELEBRADO PARA UM FIM ESPECÍFICO - I MPOSSIBILIDADE DE SE ALCANÇAR A FINALIDADE EM RAZÃO DE DECISÃO DO PODER PÚBLICO - SUSPENSÃO DO CONTRATO - POSTERIOR RESCISÃO - COBRANÇA DE ALUGUÉIS DO PERÍODO DE SUSPENSÃO - NÃO CABIMENTO - APLICAÇÃO DA "TEORIA DA IMPREVISÃO" - IDADE AVANÇADA DA PARTE - SITUAÇÃO FINANCEIRA DESFAVORÁVEL - HONORÁRIOS DE ADVOGADO - REDUÇÃO - NÃO CABIMENTO - VERBA HONORÁRIA FIXADA EM CONFORMIDADE COM OS DITAMES LEGAIS PERTINENTES - Se um contrato de locação é celebrado para um fim específico e se esse fim se torna impossível de ser alcançado em razão de ato do poder público, há que se reconhecer a existência de uma hipótese de aplicação da "teor ia da imprevisão", não se podendo cobrar os aluguéis referentes ao período em que o contrato ficou suspenso, antes de ser ao final rescindido. - Não se há de reduzir os honorários de advogado que foram fixados em conformidade com os ditames legais, sendo de se destacar que a idade avançada da parte e sua eventual situação financeira desfavorável não constituem razão para tanto.

(TJ-MG - AC: 10701110037317001 MG, Relator: Evandro Lopes da Costa Teixeira, Câmaras Cíveis / 17ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 25/ 06/ 2013)

3. CONCLUSÃO

Com isso, a Pandemia vivenciada apresenta as características necessárias para enquadrar-se juridicamente como Caso Fortuito ou Força Maior, sendo um evento inevitável e/ ou imprevisível, cujo efeito jurídico é ser um excludente de responsabilidade contratual.

Ademais, a Teoria da Imprevisão e o Princípio da Revisão dos Contratos, tratam da possibilidade de que um pacto seja alterado sempre que as circunstâncias que envolveram a sua formação forem diversas das existentes no momento da execução da obrigação contratual, de modo a prejudicar uma parte em benefício da outra.

Havendo necessidade de um ajuste no contrato como forma de se manter o equilíbrio e boa- fé, qualquer das partes pode invocá-la como forma de rompimento ou modificação da relação anteriormente assumida, caso mudanças substanciais ocorram de forma extraordinária e imprevisíveis.

O surgimento de pandemia, limitação de exercício do poder econômico pela administração e pelo o Poder Público, esvaziamento do comercio e isolamento social, poderá ser considerados como motivos ensejadores da situação excepcional vigente.

Toda essa orientação encontra ainda respaldo, nas opiniões favoráveis à possibilidade de que, verificada situação de desequilíbrio contratual (CC, arts. 478 a 480), o julgador possa até mesmo alterar os termos pactuados pelas partes. Inclusive, o caráter intervencionista é próprio do tipo contratual da locação, à evidência do que se passa nas possibilidades de revisão de preço e renovação de prazo (Lei 8.245/1991, arts. 19, 68 a 70 e 51, 71 a 75, respectivamente).[7]


[1] BRASIL. Lei 8.245/91. 18 out. 1991. Dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos e os procedimentos a elas pertinentes. Disponível em: https://www.planalto.gov.br . Acesso em: 07 jul. 2020.

[2] FUX, Luiz. Locações: processo e procedimentos. 5. ed., rev. e atual. Rio de Janeiro: Impetus, 2008.

[3] BRASIL. Lei 10.406. 10 jan. 2002. Código Civil. Disponível em: https://www.planalto.gov.br . Acesso em: 07 jul. 2020.

[4] Disponível em: https://g1.globo.com/bemestar/coronavirus/noticia/2020/07/07/casos-e-mortes-por-coronavirus-no-brasil-7-de-julho-segundo-consorcio-de-veiculos-de-imprensa.ghtml, acesso em/: 07 jul de 2020.

[5] 25ª Vara Cível de Brasília, Proc. n. 0709038-25.2020.8.07.0001, Juiz JULIO ROBERTO DOS REIS, decisão de 24.3.2020.

[6] 21ª Vara Federal Cível do Distrito Federal, Proc. n. 1016660-71.2020.4.01.3400, Juiz ROLANDO VALCIR SPANHOLO, decisão de 26.3.2020. Grifou-se.

[7] A própria lei de locações impõe o abatimento do aluguel como solução quando o imóvel resta inutilizado por determinado período, em função da necessidade de reparos urgentes: "Art. 26. Necessitando o imóvel de reparos urgentes, cuja realização incumba ao locador, o locatário é obrigado a consenti - los. Parágrafo único. Se os reparos durarem mais de dez dias, o locatário terá direito ao abatimento do aluguel, proporcional ao período excedente; se mais de trinta dias, poderá resilir o contrato".

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